Gazeta Carajás - O genuíno portal de notícias do sul e sudeste do Pará

MENU

Colunas / Coluna do Felipe Vasconcelos

Novo mandato de Maduro e os impactos geopolíticos para a América Latina e o mundo

A crise venezuelana e seus desdobramentos políticos, econômicos e sociais

Novo mandato de Maduro e os impactos geopolíticos para a América Latina e o mundo
A-
A+
Use este espaço apenas para a comunicação de erros nesta postagem
Máximo 600 caracteres.
enviando

Se as vulnerabilidades observáveis em toda a América Latina fossem retratadas por uma imagem, tal imagem seria a bandeira venezuelana. Desde o totalitarismo e a corrupção até o caos socioeconômico e ambiental, a administração venezuelana reflete muito do que tem de errado com a região.

Mas as consequências do regime chavista de Maduro não param no território de seu próprio país: se alastram, por exemplo, ao fazer parte da colossal (e complexa) disputa de influência entre os americanos e seus principais antagonistas — Rússia e China —, representando mais um porto seguro para o bloco sino-russo nas Américas, assim como Cuba.

Mas apesar de Cuba e Venezuela representarem a “oposição” contra os EUA no continente americano com retórica quase que uniforme, o país sul-americano dispõe de recursos que a pequena ilha no Caribe não consegue desfrutar. Um destes recursos é, talvez, a maior vantagem que o Kremlin e Zhongnanhai (que, inclusive, estiveram entre os primeiros a reconhecer a vitória de Maduro) têm ao se aliar com Maduro: O “ouro negro”, mais conhecido como petróleo.

A Venezuela é o país com a maior reserva de petróleo do mundo, com mais de 300 bilhões de barris (A fins de comparação, o Brasil tem cerca de 13 bilhões). Portanto, possuir tal reserva, no xadrez de poder global, significaria uma vitória significativa para um bloco, e os chineses e russos sabem muito bem disso. Tão bem que, durante os últimos protestos e revoltas populares nas cidades venezuelanas, mercenários russos foram vistos defendendo o regime.

O petróleo venezuelano, que já se mostrou a principal arma geopolítica do país, cai cada vez mais nas mãos de Rússia, China e aliados, preocupando o Ocidente. Navios carregados de petróleo com frequência saem dos portos de Cabello e Maracaibo em direção a Cuba e Rússia, por exemplo, alimentando as indústrias e a economia desses dois países. Se a geopolítica fosse realmente um tabuleiro de xadrez, conquistar o petróleo venezuelano foi uma jogada de mestre dos chineses e dos russos e, com Nicolás Maduro no poder, essa jogada está segura.

Mas para além da disputa geopolítica a maior nível entre os EUA e seus aliados e China e seus aliados, a manutenção do regime atual venezuelano tem impactos ainda mais reais (e, neste caso, preocupantes) para a política latino-americana, sumarizados em três pilares principais, que promovem turbulência e instabilidade: ideologia, migração e segurança.

O primeiro pilar se baseia em simbolismo. Uma ditadura baseada na corrupção e apropriação de instituições como as forças armadas ou o poder judiciário é a fórmula básica de um regime totalitário na América Latina, independente do lado no espectro político. Está sendo assim na Venezuela assim como já foi assim em países como Brasil, Argentina e até Chile. A manutenção de um regime assim no continente é o símbolo máximo de que o autoritarismo não foi derrotado e continua vivo na região.

O segundo pilar representa talvez a maior preocupação dos governos de todo o continente americano, incluindo até mesmo os EUA. Uma pesquisa realizada pela Meganalisis indica que mais de 44% da população considerava a hipótese de emigrar do país se Maduro fosse “eleito” para um terceiro mandato. Outra pesquisa, realizada pela ORC Consultores revelou que mais de 18% dos entrevistados planejam fugir até o final do ano no caso de mais uma vitória do presidente. Estes números assustam e muito os governos de países afetados pela migração de venezuelanos, como a Colômbia, Peru, Equador, Estados Unidos e, inclusive, o Brasil.

Isso porque acolher refugiados custa, e muito caro. Embora exista a possibilidade que o impacto econômico a longo prazo dos imigrantes venezuelanos seja bom para os países que os recebem, estes mesmos países podem carecer de recursos para recebê-los a curto prazo e as ações humanitárias podem acabar saindo mais caras do que os países podem pagar. Na Colômbia, por exemplo, país que mais recebe venezuelanos, foi divulgado que há 5 anos, em 2019, mais de 0,5% do Produto Interno Bruto (em números, mais de 6 bilhões de reais) foi investido na recepção de migrantes. Para piorar, a situação, desde então, não tem melhorado no cenário econômico da Venezuela, e na política, a situação apenas se deteriorou, o que indica que pessoas continuarão a fugir, obrigando os países que os recebem a se preparar e investir cada vez mais.

Já o terceiro pilar é dividido em duas frentes: as tensões na Guiana e a aliança do regime com o narcotráfico, ou como classificado pelo Departamento de Estado americano, narcoterrorismo.

Abordando primeiro a questão da Guiana, é uma combinação de fatores históricos e geoeconômicos que impulsionam tensões que já perduram há mais de 100 anos. Tais fatores, no entanto, são amplificados pelo governo Maduro, que os utiliza como instrumento político. Argumentando a legitimidade histórica da reivindicação venezuelana por partes do território da Guiana, ele declara frequentemente o interesse em retomar a região, com picos de militarização da fronteira sendo cada vez mais observados, ameaçando a segurança da região.

As razões pelas quais a questão da Guiana seria um imperativo para o governo chavista são duas: as grandes reservas de petróleo lá presentes, que aumentariam ainda mais a produção e as reservas venezuelanas, e o fato de um possível conflito ou escalada para um servir como instrumento para unir a população venezuelana contra um possível “inimigo externo” que segundo a retórica de Maduro, desfruta injustamente de território legítimo da Venezuela.

Essa questão da Guiana, no entanto, não será pautada pelos próximos meses (pelo menos não fortemente) mas com certeza servirá como uma carta a ser jogada quando Maduro precisar apelar para a comoção e união nacional contra um inimigo externo a fim de evitar uma desestabilização em alguma crise futura, afinal, encontrar inimigos a serem culpados é uma ótima estratégia para blindar o regime de culpa.

Já quanto ao narcotráfico, sabe-se que o mesmo é preocupação central quando o assunto é segurança na América Latina, e o governo venezuelano amplifica essa preocupação. Isto porque o regime, que já se provou altamente corrompido, tem fortes ligações com grupos narcotraficantes, especialmente na fronteira com a Colômbia, o que causa (mais uma) dor de cabeça para o país.

Portanto, é mais do que nítido que a manutenção do regime Maduro traz consequências que se dividem em uma bifurcação em dois palcos diferentes da política internacional: uma vitória para o bloco sino-russo e aliados em esfera global e preocupação e alarme quanto à estabilidade na América Latina, ao passo que o autoritarismo vence mais um episódio no mundo.

Comentários:

Felipe Vasconcelos

Publicado por:

Felipe Vasconcelos

16 anos, formado no programa de analista internacional da Escola Superior de Relações Internacionais e com cursos em universidades como Georgetown e Harvard, escreve sobre política internacional e como esta influencia o cotidiano da região sul e...

Saiba Mais

Crie sua conta e confira as vantagens do Portal

Você pode ler matérias exclusivas, anunciar classificados e muito mais!