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Um aniversário inesquecível

Breno dos Santos, geólogo descobridor de Carajás, relata uma histórica partida de futebol em comemoração a um ano da descoberta

Um aniversário inesquecível
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Gene E. Tolbert, além de sua competência profissional, possuía uma liderança nata, manifestada pela sua constante preocupação com toda equipe de campo, do geólogo ao mateiro. Era frequente o seu reconhecimento pelo trabalho executado e a sua busca pelo desenvolvimento de todos. Logo no início, fez questão de que houvesse, nos nossos precários acampamentos, uma pequena biblioteca geológica.

Os trabalhos de campo do “Brazilian Exploration Program – BEP”, o programa de exploração geológica destinado à descoberta de depósitos econômicos de minério de manganês, da siderúrgica americana United States Steel – USS, executado com o apoio administrativo de sua subsidiária brasileira Companhia Meridional de Mineração, havia começado na ilha de São Francisco do Xingu, no dia 21 de junho de 1967.

 Quase ninguém da equipe lembrava-se dessa data, mas Tolbert teve a iniciativa de que deveria haver uma boa e justa comemoração. E tinha as suas razões, pois, em apenas um ano de trabalhos de campo, tinham sido descobertas as mais importantes reservas de minério de ferro de alto teor do planeta, e o significativo depósito de manganês de Buritirama. E tudo havia acontecido nos primeiros três meses de atividade da equipe.

Em uma de suas viagens a Carajás, no acampamento da Clareira N1, deu liberdade para que fosse organizada a festa comemorativa. O que não era tarefa fácil, considerando as limitações pelo nosso isolamento.

Mas o Tolbert também facilitou essa tarefa. Como Yolanda estava em São Paulo na casa de parentes, aguardando o parto de nossa segunda filha, Tânia, passei a trabalhar duas semanas, em maio, no escritório do Rio de Janeiro. Havia a facilidade de viajar a São Paulo no final de semana, ou quando o nascimento tornasse bem próximo. Mas como o parto atrasou, tive que retornar a Belém na véspera do nascimento, pois estava programado o encontro com um americano, chegado dos Estados Unidos, para com ele viajar a Carajás.

Mas a passagem por São Paulo foi útil para comprar, na região da 25 de Março, parte do material necessário para a festa comemorativa, como nova bola de futebol, dois jogos de camisas, medalhas, etc.

A comemoração foi organizada, em grande estilo, com várias atividades esportivas, com uma feijoada no almoço e um bom churrasco no jantar. A cerveja foi liberada, mas não lembro como foi mantida razoavelmente gelada.

Nessa época tínhamos na equipe cerca de 250 pessoas, que atuavam no mapeamento preliminar, das clareiras com canga e do depósito de manganês de Buritirama, bem como na continuação da exploração geológica, buscando outros possíveis depósitos de manganês. E não houve nenhum problema no comportamento da equipe, mesmo com a cerveja liberada.

Na parte da manhã foram disputadas atividades diversas, como corrida na pista de pouso com canga, pau de sebo, corrida com saco e corrida das três pernas, com entusiástica participação das torcidas. Raimundo Albuquerque, o nosso mecânico “faz tudo”, companheiro desde os tempos de Serra do Navio, na ICOMI, foi o vencedor da grande corrida.

As equipes baseadas na Clareira N1, aos poucos fizeram surgir um pequeno campo de futebol sobre a canga, ao lado pista de pouso, junto ao estacionamento dos helicópteros e pequenos aviões. Para isso, foram retirados pequenos arbustos e os blocos soltos de canga. Essa área da clareira era razoavelmente plana por estar sobre a encaixante basáltica,

 A atividade no acampamento tinha início ao redor das 6 horas, com quase todos acordados pelo rádio da cozinha, ao som do programa “Regatão”. Após o café, as equipes partiam para as frentes de trabalho, retornando após às 16 horas.

Em algumas tardes, os mais aficionados pelas “peladas” descarregavam as energias, que ainda restavam, batendo uma bolinha. O único risco era cair na canga, o que fatalmente causava algumas escoriações.

Assim, a principal atividade das comemorações foi a partida de futebol entre os dois times criados: o Serra Norte e o Carajás.  Houve uma condenável hierarquização na formação das equipes e na escolha das camisas.

O Serra Norte, com as cores da seleção brasileira, era formado pelo quadro técnico, geólogos, pilotos, administrador e os melhores jogadores do quadro geral. O Carajás, com camisa vermelha, só pelo quadro geral.

O campo foi devidamente demarcado, e surgiram até redes nas traves feitas com pequenos troncos, provavelmente confeccionadas por algum companheiro com vocação artística.

O pontapé inicial foi dado pelo Tolbert, que desceu no centro do campo de canga, com o ritual dos grandes acontecimentos, no helicóptero Hughes 300. As duas equipes permaneceram perfiladas ao lado.

O mecânico do Piper Aztec, o bem humorado Leão, foi o rigoroso juiz, da disputada partida, vencida pela equipe do Serra Norte, por dois tentos a um. Houve até bandeirinhas.

O desenhista Abidias, com muita paciência, elaborou bonitos diplomas, que foram entregues pelo Tolbert, a cada um dos cerca de vinte empregados, que estavam no Xingu no início das operações. Não havia xerox e muito menos recursos digitais, e cada diploma foi desenhado individualmente. Guardo o meu com carinho até hoje.

Foram momentos inesquecíveis, terminados pela confraternização de todos até o sono chegar.

Na manhã seguinte, quando decolamos para Belém no Piper Aztec, o Tolbert com destino ao Rio de Janeiro e eu com destino a São Paulo, para finalmente conhecer a filha Tânia, já com um mês de vida, toda equipe, espontaneamente e em sinal de agradecimento, perfilou-se ao lado da pista durante a decolagem do pequeno avião.

Um momento difícil de esquecer...

Mecânico Raimundo vencendo a principal corrida na pista de canga (21JUN1968)

Imagem: Breno A. dos Santos

 

A disputa no pau de sebo (21JUN1968) - Imagem: Breno A. dos Santos

 

O vencedor da corrida de saco, com o apoio do cachorro Leão (21JUN1968)        

 Imagem: Breno A. dos Santos

Vencedores da corrida de três pernas (21JUN1968) - Imagem: Breno A. dos Santos

Helicóptero Hughes 300, sob o comando do piloto Aguiar, pousando no centro do campo de canga, para entrega da bola da partida, pelo geólogo Gene E. Tolbert (21JUN1968)            

Imagem: Breno A. dos Santos

 

 

Time do Carajás, ladeado por Tolbert, desenhista Abidias, juiz Leão e bandeirinha (21JUN1968) –

Imagem Breno A. dos Santos

 

Time do Serra Norte, ladeado por Tolbert, desenhista Abidias, bandeirinhas e juiz Leão. Entre outros jogadores, Otávio, Feliciano, Celso, Babá, Adão, Franciner, Breno, Rideg e Raimundo – Imagem: José M. de Aguiar

 

Flagrante da disputada partida, com o vencedor Serra Norte no ataque (21JUN1968)

Imagem: José M. de Aguiar

 

Diploma elaborado pelo desenhista Abidias e entregue por Gene E. Tolbert, aos pioneiros que iniciaram o “Brazilian Exploration Program – BEP”

 

 

 

 

 

 

 

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Breno Augusto dos Santos

Publicado por:

Breno Augusto dos Santos

Breno Augusto dos Santos é um dos maiores geólogos da história do Brasil. Conhecido como "Descobridor de Carajás", é um profissional histórico e foi o grande vencedor do prêmio Pioneiros da Mineração 2024, entregue pela revista Brasil...

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