O primeiro pesquisador a penetrar na região de Carajás foi o geólogo Avelino Ignácio de Oliveira, que subiu os rios Xingu e Fresco, em 1922. Passou bastante próximo das clareiras das jazidas de ferro de São Félix do Xingu. Se tivesse possibilidade de acesso, teria descoberto os depósitos de ferro.
Em 1933, o engenheiro Luiz Flores de Moraes Rego subiu o rio Itacaiúnas até as cabeceiras, relatando a observação de "morros de topo plano onde se encontram campos geraes". Certamente, deve ter avistado ao longe as clareiras da Serra Sul. As dificuldades de acesso impediram o reconhecimento adequado, e tudo foi interpretado como arenito.

Possível visão que Moraes Rego teve da Serra Sul – “morros de topo plano
onde se encontram campos geraes”
O primeiro trabalho de vulto foi realizado pelo DNPM/PROSPEC (Projeto Araguaia), no início dos 60, com o apoio de expressivo levantamento aerofotogramétrico, liberado ao público em meados de 1967. Como o reconhecimento de campo ficou restrito aos maiores rios, todas as clareiras, com suas lagoas, foram consideradas como testemunho de relevo cárstico, sobre arenitos calcíferos. Mais uma oportunidade foi desperdiçada para a descoberta do ferro.
Em 1966, a Union Carbide (CODIM) entrou na região atrás de informações de ocorrências de manganês na Serra do Sereno (Serra Rica ou E1), reveladas a um geólogo do DNPM por um “gateiro” - caçador de gato maracajá e de onça pintada. Sua equipe trabalhou nas proximidades da Serra Leste, e mais uma oportunidade foi perdida.
Entretanto, a CODIM, imaginando que a poderosa United States Steel possuía informações privilegiadas, ou pelo menos interpretações, de ocorrências de manganês mais próximas do transporte fluvial, deslocou em tempo recorde toda sua equipe da base de Marabá para Altamira, deixando de trabalhar no Sereno, transferindo-se para a região granítica do Bacajá.
Quando a United States Steel (Meridional) entrou na região, em maio de 1967, o objetivo era seguir o rastro da CODIM e descobrir manganês. Entretanto, por escrúpulos éticos, o geólogo-chefe do "Brazilian Exploration Program - BEP", o meu professor e amigo Gene E. Tolbert, não quis instalar a base da Meridional em Marabá, por achar que seria demais duas empresas americanas atuando na pequena cidade, na época com pouco mais de 10 mil habitantes, optando por Altamira, no Xingu.
Entretanto, a CODIM, imaginando que a poderosa United States Steel possuía informações privilegiadas, ou pelo menos interpretações, de ocorrências de manganês mais próximas do transporte fluvial, deslocou em tempo recorde toda sua equipe da base de Marabá para Altamira, deixando de trabalhar no Sereno, transferindo-se para a região granítica do Bacajá.

Assim, como o terceiro povoado, São Félix do Xingu, na época não tinha condições sanitárias para base do programa, a solução foi instalar a equipe no seringal da isolada ilha de São Francisco.

A equipe da Meridional teve sua atenção alertada para as clareiras nos primeiros voos de reconhecimento, em maio de 1967. A primeira clareira a ser avistada foi a de Serra Leste, quando do sobrevoo na área da CODIM. A segunda foi a pequena clareira da Serra Esquecida (Cururu). Numa linha de voo entre Altamira e São Félix do Xingu foram avistadas as clareiras de São Félix.

Em meados de julho de 67, Tolbert chegou à base de São Francisco com as fotografias aéreas do Projeto Araguaia. Com a simples observação do mosaico índice era possível se verificar que havia mais clareiras, e bem maiores que as observadas nos sobrevoos. Também foi observado que a geomorfologia na direção leste era mais promissora para a pesquisa de manganês, possivelmente associado a sequências vulcano-sedimentares.

Decidiu-se pela mudança da base, inicialmente para a aldeia dos Xicrins no Cateté, e depois para o Castanhal do Cinzento. Como não havia autonomia dos helicópteros para o traslado direto entre São Francisco e o Cinzento, optou-se pelo trajeto Xingu / Fresco / Carapanã / Arqueada / Cateté / Itacaiúnas / Cinzento, com abastecimento (combustível no bagageiro) nos pedrais dos rios, na clareira da Serra Arqueada e na aldeia dos Xicrin.
Assim, nesse simples pouso na Serra Arqueada, na manhã do dia 31 de julho de 1967, foi revelada a razão da existência das clareiras: canga de minério de ferro. Entretanto, apesar da hipótese de que as outras clareiras também fossem devidas à canga ser imediata, era assustador demais pelo seu potencial.
Houve imediata comunicação ao Tolbert, a partir de telefonema de Belém. Não houve interesse imediato pelo ferro, só despertado após a descoberta do manganês de Buritirama.
Devido à falta de disponibilidade de helicóptero, foi feito um reconhecimento com monomotor, a baixa altura, das clareiras da Serra Norte, confirmando a hipótese inicial.
Portanto, a descoberta do ferro de Carajás talvez tenha sido a última grande descoberta romântica da história da geologia, com a equipe responsável atuando com lances de "Indiana Jones", mas às vezes do "Exército Brancaleônico", onde o grande "herói" foi o helicóptero. Alguns anos depois, o ferro seria fatalmente descoberto com a tecnologia dos levantamentos de radar ou das imagens de satélites.
Muitas dúvidas foram levantadas sobre a descoberta de ferro, e vamos analisar algumas delas:
1 - A poderosa United States Steel já sabia das ocorrências do ferro e só fez uma simulação da descoberta.

Totalmente falso, pois o ferro foi descoberto no dia 31 de julho e as áreas só foram requeridas no dia 14 de outubro (pessoalmente preparei os requerimentos). A "poderosa" Steel não correria esse risco de perder as áreas, demorando tanto para o seu requerimento. Quando caí de helicóptero com o ministro Ueki, em 1975, no local onde seria construída a ALBRÁS, discutimos bastante essa questão. Talvez por experiência própria, o ministro não aceitava que a descoberta não tivesse sido um jogo com cartas marcadas.
2 - A CODIM já havia descoberto o ferro na Serra Leste.
Os geólogos da CODIM, apesar de novos, eram bastante competentes (muitos vieram a trabalhar na DOCEGEO) e caso tivessem tido acesso a Serra Leste certamente teriam competência para avaliar a sua importância. Pior seria imaginar que esconderiam isso de seus diretores.
3 - Outras pessoas ou pesquisadores já sabiam da ocorrência do ferro.
Isso até certo ponto é possível, pois há uma amostra de hematita ou jaspelito no Museu Goeldi, coletada no rio Itacaiúnas. Quem trabalha na região sabe que é muito fácil encontrar tais seixos nos rios da região. Só que quem coletou a amostra não a relacionou com a possibilidade da existência de uma grande jazida de ferro.
Contudo, foi a equipe da Meridional que, a partir do pouso na clareira da Serra Arqueada, deu início a uma história que pode ser seguida até hoje nas minas de ferro de Carajás.
O anúncio da descoberta
Logo que o Tolbert voltou de Carajás, ainda sob o impacto do que havia visto, enviou para o seu chefe L' Esperance, em Pittsburgh (EUA), um telegrama relatando a descoberta. O telegrama foi enviado quando de sua passagem por Belém.
Em tempos de "007", o telegrama foi cifrado, tendo a mina da U.S. Steel na Venezuela (Orinoco) como referência. O cálculo inicial que fizemos com o Tolbert foi bastante expedito, sem base técnica ou científica. Apenas foi calculada a área total de todas as clareiras, que foi multiplicada por uma espessura de 10 a 30 metros. Nem toda clareira tem minério de ferro abaixo e a espessura real é bem maior. O interessante é nesse cálculo "brancaleônico" o número médio final ficou ao redor de 20 bilhões (entre 5 e 35 bilhões) de toneladas, bem próximo do que foi obtido com a pesquisa.
O documento aqui publicado é cópia do memorando confidencial que foi enviado do Vice-Presidente Internacional para o "board" da U.S.Steel. Deve-se lembrar de que nessa época a USS era uma potência americana com o poder de uma Microsoft hoje.


Fonte/Créditos: Publicada originalmente na Revista Brasil Mineral e no livro Pelas Pedras do Caminho Mineral, da editora Signus
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