Escrevo esta coluna em virtude do complexo de vira-lata que acomete parte dos cidadãos de Canaã dos Carajás, terra do minério de ferro, e da subserviência dessa mesma parcela à empresa Vale. Na última semana, a mineradora esteve no centro das polêmicas por conta de situações envolvendo produtores rurais da região do Cristalino e um imbróglio judicial entre as partes envolvidas. Vereadores do município se posicionaram contra a empresa e a favor dos cidadãos.
Não foi surpresa nenhuma ao ver nas redes cidadãos de Canaã e região defendendo com unhas e dentes a multinacional. Muitos dizem o absurdo de que Canaã dos Carajás é o que é, uma potência econômica, graças à Vale. Convenhamos, isso é uma grande inverdade. Mas não é culpa das pessoas crerem nisso, afinal a máquina publicitária da Vale é gigantesca e o sentimento de subserviência, tão tupiniquim, está entranhado na formação das pessoas em regiões minerárias.
Canaã não é grande pela benevolência da Vale. Canaã é grande, pois tem gigantescas jazidas minerais. Do minério de ferro, passando pelo cobre, manganês, a ouro, Canaã tem e o planeta inteiro sabe disso. O município, fincado no sudeste do Pará, possui potencial mineral absoluto, é autossuficiente e terá riquezas disponíveis por gerações.
Não fosse a Vale, seria outra mineradora. Outra até maior, talvez, como BHP, que já está chegando na região, ou a Rio Tinto, ou a Glencore e tantas outras gigantescas. A Vale é só mais uma que busca lucros astronômicos em espaços de tempo cada vez menores. A mineradora é só mais um CNPJ, que paga o que é obrigada a pagar e não dá nada de graça a ninguém – afinal as coisas são assim.
Canaã não depende da Vale, ela é quem depende de Canaã. Se não fosse a Vale a explorar o S11D ou o Sossego, seriam outras e o município continuaria rico. Mas então por que o canaense acredita que deve ser grato a uma empresa que faz tão somente o mínimo?
A resposta talvez esteja em nossas raízes. Nos espelhos dados pelos portugueses durante a colonização, nos discursos bonitos, na falta de altivez tão canarinha, na necessidade de ser aceito por quem vem de fora. São muitas explicações.
Mas a verdade é uma só: Canaã seria grande de qualquer forma. A Vale estar aqui é apenas um fator que jamais alteraria o produto final. Não devemos ser gratos à Vale. A Vale é que deve ser grata a Canaã.
Não devemos nos adequar aos interesses da mineradora. Ela é quem deve se adequar aos nossos.
Precisamos ter altivez e parar de contemplar espelhos enfeitados, enquanto a bala come e somos colonizados.
Créditos (Imagem de capa): Foto: Agência Vale
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