Canaã dos Carajás é um município atípico no Brasil. Com gigantescas jazidas minerais, a Terra Prometida é responsável por alimentar parte relevante da grande demanda chinesa por minério de ferro. Os anos passam e Canaã está cada vez mais rica e a perspectiva é de crescimento econômico nos próximos anos, ainda mais com a eminente chegada da BHP, maior mineradora do planeta, na Terra Prometida.
Astronômicas arrecadações, especulações econômicas, geração de emprego, altos salários e demandas imobiliárias formam o caos perfeito para o surgimento da maior contradição do cotidiano dos canaenses: o preço dos aluguéis.
O morador de Canaã se acostumou a viver em ciclos minerários nas últimas duas décadas. Primeiro, a implantação do Projeto Sossego: mobilização de mão de obra, êxodo de trabalhadores e suas famílias para Canaã, economia pulsante, demanda imobiliária e o golpe brutal dos aluguéis. Ao fim da implantação do projeto, uma cidade sofrendo os efeitos negativos de um aumento tão rápido de sua população.
Anos depois, movimento similar no município por conta da implantação do S11D, porém com proporções ainda maiores. Ao fim da implantação, o município viveu uma das mais graves crises de sua história em 2017. Enquanto tudo isso acontecia, mais especulação imobiliária, preços exorbitantes dos aluguéis e sofrimento de toda a população.
A partir de 2019, com as receitas de Canaã em uma crescente, os aluguéis voltaram a subir e ficaram ainda mais caros em 2020 com a expansão do S11D. Mas por que isso acontece tão repetidas vezes?
Fica evidente que a mineração é o principal fator para explicar aluguéis tão caros em Canaã. Ao chegar no município, as mineradoras e suas contratadas trazem profissionais de outras cidades para trabalhar. Uma vez fora de suas cidades, cada um dos trabalhadores precisa de residência para si e suas famílias. Como sabem que projetos minerais não são para toda a vida, as empresas não compram ou constroem residências, alojamentos e escritórios: eles alugam os pontos e passam aos profissionais que ficam no local enquanto estão trabalhando no projeto mineral em questão.
Este efeito cria uma demanda imobiliária e o preço sobe naturalmente. Os proprietários dos imóveis recebem ofertas altíssimas de locação e fecham, claro, pelo melhor preço que os é oferecido. Apesar das demandas imobiliárias injetarem muito dinheiro na economia local, o alto preço dos aluguéis cria um efeito cascata que encarece o custo de vida e acaba prejudicando até quem tem casa própria.
O efeito cascata
Ao contrário do senso comum, preços tão altos de locações prejudicam toda a sociedade e não apenas quem não tem onde morar. Com residências e escritórios locados a preços astronômicos, uma bolha é formada e afeta todo o município. Pontos comerciais mais próximos ao centro são caros demais e o empreendedor cobra esse valor no preço dos produtos que vende.
Evidentemente, isso vale para todos os produtos: comida, bebida, carne, roupas, calçados, frutas, verduras, etc. O que também fica caro por conta dos aluguéis são os serviços: salão de beleza, corte e costura, estética, contabilidade, advocacia e muito mais. Isso afeta, inclusive, o empreendedor dono do próprio ponto, já que ele depende de fornecedores que precisam incluir o valor do aluguel no preço final do produto.
E detalhe: o preço das locações em Canaã sobe todos os anos acima da inflação brasileira. O comerciante eleva o preço dos produtos e serviços e até mesmo o locatório sofre com isso. E o que o locatário faz para compensar o aumento do custo de vida: cobra mais caro pelo aluguel.
Portanto, em uma roda viva, a especulação imobiliária torna o custo de vida em Canaã um dos mais elevados do país. Soluções para quebrar o ciclo da especulação? Bom, programas sociais de moradia mitigam um pouco os efeitos, mas ainda assim todos pagam, de um jeito ou de outro.
O caminho para quebrar o ciclo de especulações por conta da mineração talvez seja a sustentabilidade econômica. Uma cidade com economia diversificada não fica refém de superciclos minerários. Ou seja, o caminho para um município estável e com um custo de vida mais palpável é o investimento em outras frentes econômicas, incluindo a verticalização da produção mineral. Exportar matéria-prima não é, nem jamais será um negócio sustentável a longo prazo.
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